Em outros textos por aqui já falamos sobre a importância das relações interpessoais na vida dos seres humanos. Pode até parecer óbvio, não vivemos sós o tempo todo, necessitamos destas interações. Porém, interagir nem sempre é fácil. Muitas questões podem dificultar que tenhamos um momento satisfatório ao lado de alguém, ou que pelo menos fiquemos com a consciência tranquila por estar agindo como se gostaria.
Nós, muitas vezes, temos problemas de comunicação, não sabemos o que ou como falar. Por outras, interpretamos o outro de forma equivocada, julgando sua intenção e forma de pensar, e acreditamos mais na nossa própria suposição do que no fatos. Há também dificuldades que partem das nossas emoções, do que estamos sentindo no momento. E não é somente a raiva, que muitas vezes leva a brigas, mas também a vergonha e o medo de se expor atrapalham as nossas relações.
Imagino que você não goste da ideia de ser ou se sentir julgado e avaliado pelos outros o tempo todo. Para mim, o olhar do outro é um tanto desconfortável quando estou sentindo muita vergonha – e nesta hora meus pensamentos geralmente tendem a crer que qualquer coisa que eu fizer será criticada, ou como minha mente me diz: "serei ridícula".
Esta emoção (vergonha) em geral é desencadeada por experiências nas quais a pessoa:
se sente ou de fato é rejeitada
faz algo errado frente aos outros
é traída ou humilhada por alguém
em momentos de fracasso
E é inevitável que essas situações aconteçam com todos nós em algum momento, afinal somos pessoas e temos uma vida inteira para aprender e estarmos sujeitos a falhar em muitas situações. Errar é humano, não é? E sentir vergonha também.
Algumas pesquisas vêm investigando a associação entre a vergonha e o autocriticismo, pois não é somente frente aos outros que a sentimos. Sim, esta emoção pode surgir quando avaliamos nosso próprio comportamento como inadequado, mesmo que ele não seja.
Bem, e se a vergonha é uma emoção como qualquer outra, qual o problema dela? Quem a experimenta com frequência sabe responder facilmente. A vergonha não é uma “bobagem” como alguns podem pensar. As sensações que essa emoção desperta são desconfortáveis, como intensa dor no estômago, calor rosto.. e tendem a nos levar a evitação das situações. Ou seja, se tem vontade de fugir, sumir, não realizar aquilo que se quer ou precisa fazer. É como ficar aprisionado no próprio sentimento sem conseguir se mostrar de forma espontânea.
Identificar que a evitação, que a autocrítica ou que o desconforto ao interagir são reações de uma resposta emocional natural e não por uma falha pessoal ou por ser uma pessoa tímida, dá muito mais chances para a pessoa buscar recursos para lidar com isso. É como desmembrar o rótulo da timidez – que muitas vezes se assume ou recebe dos outros – e encontrar ali o que funciona para se ter interações mais prazerosas e significativas.
Uma estratégia interessante para quem costuma ruminar sobre sua experiência de vergonha durante uma interação social é de não se apegar (fica pensando muito sobre) aos próprios pensamentos e sensações no corpo relativos à vergonha. É possível fazer isso buscando direcionar o foco da atenção para o outro com quem se está interagindo. Escute com curiosidade e se proponha a observar o outro com interesse e gentileza. Esta é uma forma de evitar as sensações desagradáveis sem deixar de lado o objetivo de se expor e se relacionar com alguém.
Texto originalmente publicado no dia 15 de outubro de 2019 em <http://terapiascontextuais.com.br/a-vergonha-te-atrapalha/>
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